Mertolenga adopta estatuto gourmet
Nova geração de produtores alentejanos põe carne mertolenga no mapa da alimentação de luxo
Rita Gonçalves
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Nova geração de produtores alentejanos põe carne mertolenga no mapa da alimentação de luxo
Apesar de ser dotada de características únicas, a carne mertolenga era vendida de forma indiferenciada no mercado nacional. Até que, em meados do ano passado, uma nova equipa, “uma nova geração de produtores”, assume o comando da Associação de Criadores de Bovinos Mertolengos e a estratégia de marketing e distribuição sofre uma reviravolta de 360º.
A carne com Denominação de Origem Protegida (DOP) foi reposicionada no mercado como um “produto premium, gourmet e diferenciado, para um nicho de mercado que não se importa de pagar um pouco mais por uma carne de qualidade e sabor únicos”, explicou em entrevista ao Hipersuper Eduardo Mira, presidente do conselho de administração da Associação.
Além da mudança de posicionamento, a nova equipa, adaptou totalmente a imagem, quer institucional quer das embalagens, ao novo conceito de negócio. A estratégia já deu frutos: a mertolenga DOP entrou nos hipermercados Pingo Doce, após um período de interregno, e prepara-se para invadir os escaparates de mais grupos de distribuição de grande dimensão.
Para comercializar a carne junto do consumidor final, a Associação criou a Promert (Agrupamento de Produtores de Bovinos Mertolengos, S.A.). A Moderna Distribuição e o Canal Horeca “diferenciado”, são os grupos-alvo. “Temos agora um mercado mais pequeno, uma elite, mas é esse o objectivo porque também temos limitações de produção. Este produto não é para massas”.
Há três características principais e exclusivas que permitem adoptar o posicionamento gourmet: a tenrura, a suculência e a intensidade do sabor da carne. O puro mertolengo “está intimamente ligado ao sobrado alentejano, é criado em pastorio e alimenta-se da grande biodiversidade de pastagens. Todas estas características influenciam as propriedades organolépticas da carne”.
A Associação reúne 242 criadores, distribuídos pelo Alentejo, Beira Interior, Ribatejo e Açores, que detêm 20 mil efectivos. Apenas metade dos animais são de linhagem pura, e são estes que asseguram o abastecimento de carne DOP. “Cerca de 10 mil estão em cruzamento industrial. Ou seja, para retornar à linha pura é preciso ultrapassar um período superior a dois anos. O nosso objectivo é aumentar a aposta no DOP gradualmente até atingir cerca de 80% dos efectivos”.
Mas, para isso, é preciso convencer os produtores. “É necessário assegurar um retorno financeiro compensatório aos produtores para que deixem de fazer cruzamento industrial com raças exóticas. A Mertolenga DOP tem um ritmo de crescimento mais lento e produz menos carne quando comparado com os bovinos cruzados. Daí termos apostado neste novo posicionamento, que vai acrescentar valor a este mercado”.
A rusticidade é uma das principais características da mertolenga. “É uma raça com características muito especiais, capaz de produzir nas piores condições. O Alentejo é de extremos: o Inverno é frio e chuvoso e o Verão quente e árido”, explica Eduardo Mira.
Como descreve Bernardo Lima, médico que ocupou diversos cargos públicos relacionados com a pasta da Agricultura, em 1873, o mertolengo “é um alentejano pequeno, bem adaptado aos cerros de magras pastagens e duros carregos. Rijo para carrear e lavrar nas encostas e serras e produzindo o melhor boi de cabestro, existindo no Baixo Alentejo, nas terras de Mértola [que lhe empresta o nome] Alcoutim e Martinlongo”.
A certificação “Denominação de Origem Protegida” garante que “todo o método de produção, transformação e elaboração, ocorrem numa zona geográfica limitada com um saber fazer reconhecido e verificado. Os produtos são acompanhados, desde o primeiro passo da sua produção até chegar ao ponto de venda, por uma entidade independente”. Eduardo Mira faz questão de explicar o que significa DOP porque, segundo a sua experiência, “apenas 2% da população sabe o que é um produto DOP”.
A Associação de Criadores de Bovinos Mertolengos, criada em 1987, gere o livro genealógico da raça desde 1992. A Associação faz ainda a gestão da DOP, dá apoio técnico aos criadores, promove a preservação, experimentação e demonstração da mertolenga, e tem em curso um programa de melhoramento da raça.